domingo, 24 de abril de 2016

A ÉTICA ANTES DE ARISTÓTELES

O intelectualismo socrático consiste em uma filosofia e uma ética racionalizada de Sócrates que centraliza a razão como ponto determinante no exercício do agir, eliminando qualquer possibilidade de erro de um agente. Portanto, a virtude se resume, exclusivamente, no ato racional do indivíduo  e isso acontece em prol do conhecimento adquirido que assim, o torna apto para exercer qualquer ação moral, ética e social.

Para Sócrates o individuo só erra por ignorância ao que é certo; ao que é do bem. Entretanto, Sócrates não se prende na ação da vontade e nem das emoções de um agente, assim um agente através do conhecimento intelectual saberia num ato de “escolha” agir em virtude do bem e ignorar o mal, ou seja, o conhecimento é por excelência tudo que um agente precisa adquirir no decorrer da vida, para agir corretamente em suas condutas. Portanto, a excelência moral proposta por Sócrates consiste na impossibilidade de erro por parte do agente já que o conhecimento nos dá a capacidade de saber discernir o bem do mal, posto que conhecemos cada um em sua total forma. No entanto, o agente que consegue se desviar do poder devastador das emoções pode se considerar um sábio, um virtuoso. Porém, somente o agente que adquire o saber conhece a via da verdade e assim consegue resistir aos prazeres externos e as emoções e uma vez que o agente adquire o saber e conhece a via da verdade não tende ceder aos prazeres, emoções e paixões, que por sua vez são guiados pelas vontades dos sentidos. Porém, Sócrates acredita que só através da razão é possível evitar o mal, ou seja, a virtude é dada por Sócrates por excelência e não de modo específico a cada parte dela, como sabedoria, bondade, respeito, moderação e outras partes da virtude humana, mostradas mais adiante por Aristóteles.

CONCLUÍMOS QUE:

Sócrates faz valer na ideia de que um agente virtuoso não centraliza o conhecimento em si mesmo, mas, passa adiante aquilo que sabe. Em meio a isso, Platão e Aristóteles, filósofos contemporâneos de Sócrates, problematizaram esse método racional de ver a ética e a virtude humana.
POR OUTRO ÂNGULO, contrariando o racionalismo socrático, voltamos na antiguidade e retratamos o papel das emoções e sua função no conjunto que forma a natureza humana, sua influência e importância em um ato de escolha, interagindo assim com a razão. (Sófocles, Eurípides, e Ésquilo).


A ÉTICA DE PLATÃO:

Sendo ele um fiel discípulo de Sócrates teve como referência em seus ensinamentos a ética voltada e focada na razão do agente, todavia, admitindo e inserindo as emoções humanas como parte do indivíduo no processo referente ao ato de fazer suas escolhas vendo a verdadeira ética e a verdadeira política, como aquela que por sua vez, cura a alma humana e a torna a mais virtuosa possível. Portanto, Platão divide a cidade em três classes sociais sendo elas: dos comerciantes; dos guardas e dos governantes. No entanto, relacionado a essas mesmas classes, ele destaca e classifica as partes da alma da seguinte forma: parte RACIONAL, que domina os prazeres e as paixões, parte IRASCÍVEL, que se compara ao vigor, vontade e determinação, e a parte APETITIVA, que se corresponde às paixões, prazeres, e desejos.


Assim, Platão admite as emoções presentes no agente no ato de agir deliberadamente, ao contrário de Sócrates, mas continua com a ideia em que a razão é por sua vez soberana no ato ou no exercício de uma ação.




OS POETAS TRÁGICO E A FORÇA ARRASTADORA DA EMOÇÃO




Voltemos nossos olhares para a cultura grega da época que nos trás os poetas trágicos e suas tragédias, e que atuam sobremaneira sobre a ética. Levando-se em conta que a cena humana é inteiramente dominada por deuses, o teatro grego fez a experiência cênica da liberação ante o divino, isto é, as personagens dos poetas Ésquilo, Sófocles e Eurípedes não seguem um plano predeterminado pelos deuses, mas ao contrário eles são responsáveis pelos seus próprios atos.  

Antígone, por exemplo, na tragédia homônima, manifesta a força dos desejos humanos e os excessos aos quais os desejos podem arrastar os homens: ela é vitima de um desejo pelo irmão, que ela sente com intensidade, embora não possa realizá-lo plenamente. Antígone é uma jovem que age por sua própria conta. Ela decide dar uma sepultura digna ao irmão Polinice, indo dessa forma contra o decreto de Creonte, que proibia expressamente tal ato.

A história tem início com a morte dos dois filhos de Édipo, Etéocles e Polinices, que se mataram mutuamente na luta pelo trono de Tebas. Com isso sobe ao poder Creonte, parente próximo da linhagem de Jocasta. Seu primeiro édito dizia respeito ao sepultamento dos irmãos Labdácidas. Ficou estipulado que o corpo de Etéocles receberia todo cerimonial devido aos mortos e aos deuses. Já Polinices teria seu corpo largado a esmo, sem o direito de ser sepultado e deixado para que as aves de rapina e os cães o dilacerassem. Creonte entendia que isso serviria de exemplo para todos os que pretendessem intentar contra o governo de Tebas. Ao saber do édito, Antígona deixa claro que não deixará o corpo do irmão sem os ritos sagrados, mesmo que tenha que pagar com a própria vida por tal ação. Mostra-se insubmissa às leis humanas por estarem indo de encontro às leis divinas. Esta trágica e frágil figura é a única protagonista de uma cena isenta dos deuses.

Para Sófocles a ação humana só pode ser compreendida no cruzamento da razão e da emoção. A eliminação de um desses polos leva a total incompreensão do agir.



Em Eurípides, as personagens tornam-se as únicas responsáveis pelas próprias paixões, sentimentos puramente e unicamente humanos.


A mesma persuasão manifesta-se na reflexão de Eurípides. O poeta trágico reconhece a presença de uma componente diferente da razão, a qual interfere fortemente com os mandamentos da razão. Um dos princípios da ação humana é o impulso (thymos) e ele pode se tornar responsável pelo assombramento da razão. O thymos não é, segundo Eurípides, uma força que age do exterior do homem, mas é uma parte da alma. A ação não depende, portanto, apenas da posse de conhecimento. As personagens de Medeia e de Fedra não são vítimas da ignorância, nem de uma perversão da razão. 

Medeia é uma personagem da mitologia grega, descrita extensivamente na peça Medea, de Eurípedes e no mito de Jasão e os Argonautas. Medeia era uma mortal filha do rei da Cólquida, e neta do deus do sol Helio. Em diversos mitos Medeia é descrita como uma feiticeira, muitas vezes ligada à deusa Hécate (deusa da bruxaria e das encruzilhadas).

A história desta mulher inicia-se com a chegada do herói Jasão a Cólquida, para obter o Velo de Ouro (a lã de ouro do carneiro alado Crisómalo) necessário para sua volta ao trono da Tessália. Medeia apaixona-se por Jasão e promete ajudar-lhe, com a condição de que se ele obter o Velo de Ouro, os dois se casem. Para que Jasão obtenha o poderoso Velo, ele teve de realizar certas tarefas. A primeira delas consistia em lavrar um campo com dois touros gigantecos, de cascos de bronze e que expeliam fogo pelas narinas. Medeia deu-lhe um unguento para proteger a si e suas armas do fogo. A segunda tarefa consistia em semear um campo lavrado com dentes de um dragão. Dos dentes nasceu um exército de violentos guerreiros mas Jasão havia sido alertado por Medeia, que lhe aconselhou a jogar uma pedra no meio deles. Sem saber de onde veio a agressão, os soldados atacaram-se uns aos outros. Finalmente Jasão deveria matar um dragão insone que guardava o Velo. Medeia colocou a besta para dormir, utilizando poderosas ervas narcóticas. Jasão então tomou o Velo de Ouro e foi-se embora com Medeia, conforme prometido.

Para garantir sua fuga, Medeia matou seu irmão Apsirto e desmembrou-o pelo caminho, sabendo que seu pai ficaria devastado com a perda e pararia para coletar os restos do filho, garantindo-lhe um funeral adequado. Desta forma, Medeia e Jasão conseguem embarcar na nau Argos e fugir da Cólquida. Após diversas aventuras e muita crueldade (por parte dos dois), o casal chega a Corinto, onde Jasão se apaixona pela filha do rei, Gláucia, e abandona Medeia.

Na peça de Eurípedes, Jasão confronta Medéia e tenta explicar-se, dizendo que não poderia deixar passar a oportunidade de se casar com uma princesa, enquanto que Medéia é apenas uma mulher bárbara e conta-lhe que pretende juntar suas duas famílias mantendo-a como sua amante. Ela lembra-lhe que deixou sua família para trás para seguí-lo e salvou-lhe a vida diversas vezes. Ela fica desolada e resolve vingar-se enviando a Gláucia um vestido e uma pequena coroa envenenados, o que resulta na morte da princesa e do rei, que correu para acudí-la.  Cega de dor e de ódio, Medéia decide matar seus filhos também, com o intuito de causar o máximo de dor a Jasão. Na peça, ela sai do palco para buscar uma faca e os gritos dos meninos são ouvidos nos bastidores. Jasão corre para vingar-se, mas vê Medeia à distância, em uma carruagem dourada enviada por seu avô, Hélio, deus do Sol, a dizer:

 "Eu nem mesmo deixo-te os corpos dos nossos fihos; eu os levo comigo para enterrar. E para vós, que me fizeste todo o mal, eu profetizo uma maldição final."


O cálculo que precede suas ações minuciosamente articulado. Medeia é uma mulher de origem bárbara, movida por ciúme e por rancor. Ela acaba por fazer de seus filhos uma sopa que oferece como comida a Teseu, sabendo que seu ato é execrável, mas incapaz de silenciar seu desejo de vingança. Os deuses são ausentes, apenas abrem e fecham o cenário trágico. Medeia é vítima do desejo de vingança. Ela é ciente do fato de que a vingança não é moralmente superior ao amor que ela sente pelos filhos, mas o desejo de vingança é mais intenso e no combate com o equilíbrio da razão terá a última palavra. Medeia sabe que sua ação é malvada, cruel e inaceitável.  Porém, ela age. A tragédia de Medeia relata os efeitos do excesso de raiva. O termo “raiva”, ou “ira”, aparece muitas vezes, pelo menos 20, no interior da tragédia.  Medeia não consegue resistir à sua raiva desgovernada.  A heroína não é uma pessoa cruel, mas raiva que a torna cega frente aos valores morais. Todas as suas ações são ditadas pela compulsão cega e violenta. Medeia sabe que sua vingança é vergonhosa, é ciente do fato que será condenada a vaguear sem lar, sem encontrar a paz, mas nada pode frear seus impulsos. Ela sabe que, sem os seus próprios filhos, sua vida perderá qualquer sentido. Ela figura em sua imaginação o sorriso doce das crianças que ela mesma irá matar e por um momento pensa em desistir. Contudo, eis uma lembrança que luta com a primeira: aquela do insulto súbito. Essa imagem, essa dor faz com que ela veja nos rostos dos filhos apenas a semelhança que eles têm com Jasão. O poder arrastador da dor e da vingança supera a lucidez da razão e faz com que ela leve seus planos até a realização.

FELICIDADE, VIRTUDE E RAZÃO PRÁTICA


Para Aristóteles a sua primeira preocupação ao começar a Ética Nicomaqueia era definir a felicidade (eudaimonia).

A primeira definição é a seguinte: a felicidade é uma atividade da alma em consonância com a virtude. Aristóteles atribuiu duas características a felicidade, e que não pertence aos dias de hoje.

A primeira é felicidade e racionalidade, segundo considerar a felicidade uma atividade e não um estado psicólogo da alma. Para Aristóteles a felicidade não é apenas um estado de bem estar, mas uma plena realização do homem.

O filósofo define felicidade como um bem supremo do homem, o fim de suas ações. Esse fim liga a felicidade a valores e desejos visto que Aristóteles define o bem como aquilo que é visado pelas ações humanas. 

A felicidade é o bem supremo e o último de nossos desejos e por consequência, de nossas ações, pois o alcance de nossas ações, pois o alcance da felicidade não é instrumental. Isso quer dizer que os outros bens podem se relacionar facilmente numa cadeia de meios e fins, ao passo que a felicidade não é meio para outro fim superior a ela. 

O único fim que interrompe a cadeia de questões e a felicidade, porque não faz sentido perguntar em que medida ela quer ser feliz. A felicidade não tem outro fim superior a ela. 

A felicidade é um bem inclusivo, harmonioso conjunto de bens. Para Aristóteles a função própria do homem é o exercício da razão, para ele essa função pode ser só exercida, ou exercida muito bem, isto é de forma virtuosa. 

Com isso a realização do homem, sua felicidade, será excelente realização própria. Para Aristóteles o homem para ser feliz, não deve apenas satisfazer seus próprios desejos, seus desejos tem que ser bom, e quem determina o valor do desejo é a razão prática. 

O desejo é eliminado, mas não deve se harmonizar com a razão prática, para se tornar desejo bom, logo o desejo humano não é bestial.


 A DEFINIÇÃO DE VIRTUDE MORAL


De acordo com Pierre Aubenque, Aristóteles  parte do pensamento de Sócrates, Platão, dos Sofistas e da tradição e faz uma síntese destacando os pontos fracos. Na sociedade aristocrata arcaica , a virtude (arete) é considerada um atributo inato, um fim da natureza.

Para os sofistas a virtude é adquirida mediante a educação, os sofista se consideravam nestes da virtude ética, e política.
Para Aristóteles no caso da ética, o Estrategista aceita as teses que: a virtude, de certa maneira é uma capacidade data ao homem por natureza, mas é alimentada pela educação e aperfeiçoada pela inteligência.
Para que o agente seja homem virtuoso ele tem que relacionar as funções da alma e envolve-las na vida prática e praticar o bem.
Aristóteles considera que os conteúdos da alma são:
As emoções ou afecções  (pathe)
As faculdades ou capacidades (dynameis)
As disposições ou Estados (eixes)
A virtude da alma segundo Aristóteles deve se identificar com uma dessas três manifestações.
Ele diferencia o homem dos animais, relação a paixão.  O animal é vítima das suas próprias emoções, ele não sabe agir sobre as paixões,  o homem é o contrário, difere do animal, visto que o agente não  é passivo diante das emoções.
Hamlet de Shakespeare diz: ”Nada é bom ou ruim, só o pensamento o torna assim”. Não é possível falar de virtude sem emoções, elas dão origem ao ato moral, elas movem o agente não é puramente passivo e sim ativo frente as emoções, a parte irracional da alma não é surda a razão.
Aristóteles reconhece uma primazia de emoções é responsável para colocar o fim na ação.
A razão não age na ausência da emoção, para ele a presença da emoção na ação moral é importante quanto a presença da razão.
As virtudes não são paixões, nem atitudes naturais, elas só podem ser disposições. A disposição é uma atitude que só o homem se torna ativa frente a emoções. Toda disposição é um comportamento estável em relação as emoções, por isso é traduzido como “estado de caráter”.

  

O PRESSUPOSTO DA VIRTUDE MORAL




Como é possível adquirir uma disposição, uma heixes?

Se os homens praticam atos justos e maduros, elas se tornam justos e moderados (Aristóteles)
Para Aristóteles a resposta não é tão simples quanto parece, um homem justo não é aquele que realiza atos justos. Uma ação é moralmente justa quando a pessoa que a realiza age como se agiria um homem justo. Embora haja uma semelhança entre arte e a Ética, as coisas não desenvolvem de uma forma igual.
Devemos respeitar três condições específicas:
1- RAZÃO: a pessoa tem que agir conscientemente e não ignorando o que ela faz.
2- O homem virtuoso tem que agir livremente, não constringido, nem tendo em vista fins alheios.
3- O virtuoso tem que agir com uma intenção firme, ou seja, por hábito. Aristóteles ressalta em diferentes lugares a importância da firmeza e da perseverança nas ações do sábio.

A ética não é uma arte, o homem virtuoso tem que ter conhecimento sem livre escolha, e perseverança adianta pouco ou nada. As ações virtuosas são avaliadas através das ações e da intenção do agente.
Só no pleno respeito das três exigências mencionadas a pessoa adquire sua natureza ética.
Observa Zingano, ”o homem virtuoso precisa previamente os bons hábitos para então poder fazer operar em seu interior o ato racional que instaura a prudência”. O que aparece nessa observação é que está relacionada na tripartição da alma humana, que Aristóteles herda de Platão. O filósofo realiza uma primeira distinção entre a parte racional e a parte privada da razão.
Há pessoas em que as emoções gritam mais alto do que a razão e está última não há como intervir, essas pessoas são vítimas de acrasia, isto é fraqueza moral. São cientes de tudo que a razão manda fazer, mas não fazem.
Para entender o desenvolvimento que Aristóteles dá a sua ética, é importante lembrar que o filósofo reconhece que a parte emotiva da alma tem capacidade de obedecer a razão.




 




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